MANIFESTO DA SOCIEDADE CIVIL SOBRE A VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS DECORRENTE DO FECHAMENTO DE FRONTEIRAS A REFUGIADOS E MIGRANTES VULNERÁVEIS
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MANIFESTO DA SOCIEDADE CIVIL SOBRE A VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS DECORRENTE DO FECHAMENTO DE FRONTEIRAS A REFUGIADOS E MIGRANTES VULNERÁVEIS
Este manifesto tem por objetivo apontar a violação sistemática de direitos humanos e das garantias fundamentais asseguradas pela Política de Estado Brasileira aos refugiados e migrantes por razão humanitária, a partir de medidas adotadas pelo Governo Federal durante a crise sanitária do COVID-19, e contribuir para uma postura combativa por parte das públicas ligadas aos órgãos do sistema de justiça brasileiro para que tais violações cessem.
Desde março de 2020, invocando a emergência decorrente da pandemia do COVID-19 e recomendação da ANVISA, o Governo Federal vem expedindo sucessivas portarias interministeriais dirigidas ao fechamento das fronteiras à população migrante reconhecida pelo Estado brasileiro como refugiada e por razão humanitária. A primeira delas, Portaria n. 120, de 17 de março de 2020, foi dirigida especificamente aos nacionais venezuelanos, refugiados reconhecidos prima facie pelo Estado brasileiro, sob o argumento “Art. 3º. I – da dificuldade de o Sistema Único de Saúde brasileiro comportar o tratamento de estrangeiros infectados pelo coronavírus SARS-CoV-2; e II – da dificuldade de impedir a disseminação do coronavírus SARS-CoV-2.”, prevendo “Art. 6º. II – a deportação imediata do agente infrator e a inabilitação de pedido de refúgio.” O conteúdo desta portaria vem sendo reeditado em sucessivas outras mais amplas, onde se mantém expressa a restrição de ingresso aos refugiados e migrantes venezuelanos e a penalidade de repatriação ou deportação imediata e inabilitação da solicitação de refúgio. Atualmente, está em vigor a Portaria Interministerial 652, de 25 de janeiro de 2021.
Apesar do estado de emergência sanitária, nenhum governo está autorizado a promover supressão de direitos fundamentais e garantias de direitos humanos como “resposta sanitária”. O estado de emergência requer a responsabilidade dos governos diante das populações em situação de vulnerabilidade, de que são exemplos refugiados e migrantes por razão humanitária, condição reconhecida pela Lei de Migração, n. 13.445/2017, e pela Lei de Refúgio, n. 9474/1997. Os sucessivos atos do Governo Federal que, utilizando o momento da crise sanitária, promovem supressão de direitos fundamentais à população vulnerável protegida por Política de Estado Brasileira representam gravíssima violação de direitos humanos e ataque ao Estado Democrático de Direito. Tais atos expressamente violam: a Lei de Refúgio n. 9474/1997 que assegura o direito à solicitação de refúgio, independentemente da forma de ingresso no país, e garante o princípio da não-devolução, pilares da proteção internacional dos refugiados; a Convenção de Genebra de 1951, da qual é signatário o Estado brasileiro; a Lei de Migração n. 13.445/2017 que garante o acesso igualitário aos direitos sociais à população migrante, a promoção da regularização documental, direito à reunião familiar, proíbe a repatriação e deportação sumárias e garante o devido processo legal; além de atentarem contra a Constituição Federal que assegura a dignidade da pessoa humana como princípio norteador e o Direito Internacional dos Direitos Humanos.
O fechamento das fronteiras aos imigrantes venezuelanos que se deslocam motivados pela crise humanitária tem promovido um desastre humanitário aqui no Brasil. Essa imigração não cessou com o fechamento das fronteiras, pois é uma imigração motivada por razões humanitárias. Ela tem ocorrido por meio de rotas de alta periculosidade, as chamadas “trouxas”, em meio a selva amazônica, onde a vida e a integridade dos migrantes, sobretudo crianças, idosos e mulheres, é colocada em risco. São muitos os relatos de exploração de migrantes nestas rotas inseguras e não reguladas pelo Estado. Hoje cerca de 5.000 migrantes venezuelanos não documentado* estão confinados em Roraima, especialmente na cidade fronteiriça de Pacaraima e na capital Boa Vista. Como não dispõem de documentos, também estão impedidos de participarem do programa de interiorização do Governo Federal. Desde o fechamento da fronteira até fevereiro de 2021, os indocumentados não conseguiam acessar as políticas de acolhida da Operação Acolhida do Governo Federal. A partir de fevereiro, grupos prioritários, como famílias com crianças, doentes e idosos, passaram a ser admitidos e cadastrados nos alojamentos e abrigos do programa do Governo Federal. Até então, apenas a sociedade civil prestava o acolhimento e abrigamento desta população indocumentada, com sobrecarga de sua capacidade, implicando na concentração de pessoas em condições precárias, embora a crise sanitária e o esgotamento do sistema de saúde local.
A insegurança jurídica produzida por atos administrativos contrários à lei e, portanto, ao Estado Democrático de Direito tem extrapolado para violações em cadeia no marco das migrações. Exigências específicas começaram a ser instituídas para a obtenção do pedido de residência de imigrantes venezuelanos ou não, a exemplo, comprovantes da entrada no país, apesar da garantia legal de promoção da regularização documental, além da dificuldade de conseguirem atendimento no sistema de saúde, contrariando frontalmente o que determina a Lei de Migração, que assegura igualdade de acesso sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória.
O Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União têm tomado iniciativas para barrar os efeitos gravosos gerados pelo conjunto destas Portarias Interministeriais, que se irradiam por todo o país. São exemplos a Ação Civil Pública n. 1000073-63.2021.4.4200, que obteve liminar que impede a deportação de crianças e imigrantes indígenas em Roraima; e a Recomendação do Ministério Público Federal à Delegacia de Polícia Federal em Passo Fundo, RS, para que receba as solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins, bem como para que deixe de exigir dos migrantes comprovante de entrada regular no país.
Esse é o retrato da situação de desastre humanitário gerada por um Governo que adota práticas xenófobas, sustentadas na desinformação, para restringir direitos e negar respostas de políticas públicas. A inclusão da população migrante venezuelana nas sucessivas portarias do Governo Federal, além de violar garantias asseguradas no nosso sistema jurídico, também não encontra respaldo técnico, pois a República Bolivariana da Venezuela não consta como país de risco de disseminação de novas variantes do coronavírus, assim como diversos outros países de envio de migrantes por razão humanitária e refugiados, conforme orientação da ANVISA. Aliás, a Coordenação de Vigilância Epidemiológica em Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados (COVIG/GGPAF/Anvisa) afirmou que “As restrições a estrangeiros provenientes da República Bolivariana da Venezuela não constam em nenhum dos documentos apresentados pela Anvisa para subsidiar a tomada de decisão do referido Comitê.”**
O projeto do atual Governo Federal está calcado no desprezo pela população vulnerável e na xenofobia decorrentes da supressão de direitos da população migrante e refugiada, assegurados pelo Estado brasileiro com muita luta da sociedade civil. Ao utilizar de instrumentos como a “inabilitação para a solicitação de refúgio”, “deportação sumária” e o “impedimento de regularização migratória de qualquer natureza” introduz mecanismos de Estado de Exceção em gritante afronta ao princípio do devido processo legal e do direito de acessar direitos. É necessário o cessamento imediato de tal violência em nome do Estado Democrático de Direito e, sobretudo, em DEFESA DA VIDA, DO DIREITO HUMANO DE MIGRAR E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA!*Dado apontado na Nota Conjunta do MPF, DPU, DP-RR e MP-RR, de 23 de fevereiro de 2021. Disponível em
<http://www.mpf.mp.br/pfdc/temas/atuacao-do-mpf/notas-tecnicas/nota-tecnica-conjunta-1-2021-mpf-dpu-dpe-rr-mp-rr>. Acesso em: 08 de março de 2021.
**Carta resposta à CONECTAS, organização da sociedade civil. Disponível em:
<https://www.conectas.org/noticias/governo-bolsonaro-desconsidera-orientacao-da-anvisa-sobre-fechamento-de-fronteiras> Acesso em: 08 de março de 2021.
Desde março de 2020, invocando a emergência decorrente da pandemia do COVID-19 e recomendação da ANVISA, o Governo Federal vem expedindo sucessivas portarias interministeriais dirigidas ao fechamento das fronteiras à população migrante reconhecida pelo Estado brasileiro como refugiada e por razão humanitária. A primeira delas, Portaria n. 120, de 17 de março de 2020, foi dirigida especificamente aos nacionais venezuelanos, refugiados reconhecidos prima facie pelo Estado brasileiro, sob o argumento “Art. 3º. I – da dificuldade de o Sistema Único de Saúde brasileiro comportar o tratamento de estrangeiros infectados pelo coronavírus SARS-CoV-2; e II – da dificuldade de impedir a disseminação do coronavírus SARS-CoV-2.”, prevendo “Art. 6º. II – a deportação imediata do agente infrator e a inabilitação de pedido de refúgio.” O conteúdo desta portaria vem sendo reeditado em sucessivas outras mais amplas, onde se mantém expressa a restrição de ingresso aos refugiados e migrantes venezuelanos e a penalidade de repatriação ou deportação imediata e inabilitação da solicitação de refúgio. Atualmente, está em vigor a Portaria Interministerial 652, de 25 de janeiro de 2021.
Apesar do estado de emergência sanitária, nenhum governo está autorizado a promover supressão de direitos fundamentais e garantias de direitos humanos como “resposta sanitária”. O estado de emergência requer a responsabilidade dos governos diante das populações em situação de vulnerabilidade, de que são exemplos refugiados e migrantes por razão humanitária, condição reconhecida pela Lei de Migração, n. 13.445/2017, e pela Lei de Refúgio, n. 9474/1997. Os sucessivos atos do Governo Federal que, utilizando o momento da crise sanitária, promovem supressão de direitos fundamentais à população vulnerável protegida por Política de Estado Brasileira representam gravíssima violação de direitos humanos e ataque ao Estado Democrático de Direito. Tais atos expressamente violam: a Lei de Refúgio n. 9474/1997 que assegura o direito à solicitação de refúgio, independentemente da forma de ingresso no país, e garante o princípio da não-devolução, pilares da proteção internacional dos refugiados; a Convenção de Genebra de 1951, da qual é signatário o Estado brasileiro; a Lei de Migração n. 13.445/2017 que garante o acesso igualitário aos direitos sociais à população migrante, a promoção da regularização documental, direito à reunião familiar, proíbe a repatriação e deportação sumárias e garante o devido processo legal; além de atentarem contra a Constituição Federal que assegura a dignidade da pessoa humana como princípio norteador e o Direito Internacional dos Direitos Humanos.
O fechamento das fronteiras aos imigrantes venezuelanos que se deslocam motivados pela crise humanitária tem promovido um desastre humanitário aqui no Brasil. Essa imigração não cessou com o fechamento das fronteiras, pois é uma imigração motivada por razões humanitárias. Ela tem ocorrido por meio de rotas de alta periculosidade, as chamadas “trouxas”, em meio a selva amazônica, onde a vida e a integridade dos migrantes, sobretudo crianças, idosos e mulheres, é colocada em risco. São muitos os relatos de exploração de migrantes nestas rotas inseguras e não reguladas pelo Estado. Hoje cerca de 5.000 migrantes venezuelanos não documentado* estão confinados em Roraima, especialmente na cidade fronteiriça de Pacaraima e na capital Boa Vista. Como não dispõem de documentos, também estão impedidos de participarem do programa de interiorização do Governo Federal. Desde o fechamento da fronteira até fevereiro de 2021, os indocumentados não conseguiam acessar as políticas de acolhida da Operação Acolhida do Governo Federal. A partir de fevereiro, grupos prioritários, como famílias com crianças, doentes e idosos, passaram a ser admitidos e cadastrados nos alojamentos e abrigos do programa do Governo Federal. Até então, apenas a sociedade civil prestava o acolhimento e abrigamento desta população indocumentada, com sobrecarga de sua capacidade, implicando na concentração de pessoas em condições precárias, embora a crise sanitária e o esgotamento do sistema de saúde local.
A insegurança jurídica produzida por atos administrativos contrários à lei e, portanto, ao Estado Democrático de Direito tem extrapolado para violações em cadeia no marco das migrações. Exigências específicas começaram a ser instituídas para a obtenção do pedido de residência de imigrantes venezuelanos ou não, a exemplo, comprovantes da entrada no país, apesar da garantia legal de promoção da regularização documental, além da dificuldade de conseguirem atendimento no sistema de saúde, contrariando frontalmente o que determina a Lei de Migração, que assegura igualdade de acesso sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória.
O Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União têm tomado iniciativas para barrar os efeitos gravosos gerados pelo conjunto destas Portarias Interministeriais, que se irradiam por todo o país. São exemplos a Ação Civil Pública n. 1000073-63.2021.4.4200, que obteve liminar que impede a deportação de crianças e imigrantes indígenas em Roraima; e a Recomendação do Ministério Público Federal à Delegacia de Polícia Federal em Passo Fundo, RS, para que receba as solicitações de refúgio, acolhida humanitária e afins, bem como para que deixe de exigir dos migrantes comprovante de entrada regular no país.
Esse é o retrato da situação de desastre humanitário gerada por um Governo que adota práticas xenófobas, sustentadas na desinformação, para restringir direitos e negar respostas de políticas públicas. A inclusão da população migrante venezuelana nas sucessivas portarias do Governo Federal, além de violar garantias asseguradas no nosso sistema jurídico, também não encontra respaldo técnico, pois a República Bolivariana da Venezuela não consta como país de risco de disseminação de novas variantes do coronavírus, assim como diversos outros países de envio de migrantes por razão humanitária e refugiados, conforme orientação da ANVISA. Aliás, a Coordenação de Vigilância Epidemiológica em Portos, Aeroportos, Fronteiras e Recintos Alfandegados (COVIG/GGPAF/Anvisa) afirmou que “As restrições a estrangeiros provenientes da República Bolivariana da Venezuela não constam em nenhum dos documentos apresentados pela Anvisa para subsidiar a tomada de decisão do referido Comitê.”**
O projeto do atual Governo Federal está calcado no desprezo pela população vulnerável e na xenofobia decorrentes da supressão de direitos da população migrante e refugiada, assegurados pelo Estado brasileiro com muita luta da sociedade civil. Ao utilizar de instrumentos como a “inabilitação para a solicitação de refúgio”, “deportação sumária” e o “impedimento de regularização migratória de qualquer natureza” introduz mecanismos de Estado de Exceção em gritante afronta ao princípio do devido processo legal e do direito de acessar direitos. É necessário o cessamento imediato de tal violência em nome do Estado Democrático de Direito e, sobretudo, em DEFESA DA VIDA, DO DIREITO HUMANO DE MIGRAR E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA!*Dado apontado na Nota Conjunta do MPF, DPU, DP-RR e MP-RR, de 23 de fevereiro de 2021. Disponível em
<http://www.mpf.mp.br/pfdc/temas/atuacao-do-mpf/notas-tecnicas/nota-tecnica-conjunta-1-2021-mpf-dpu-dpe-rr-mp-rr>. Acesso em: 08 de março de 2021.
**Carta resposta à CONECTAS, organização da sociedade civil. Disponível em:
<https://www.conectas.org/noticias/governo-bolsonaro-desconsidera-orientacao-da-anvisa-sobre-fechamento-de-fronteiras> Acesso em: 08 de março de 2021.
Rio Grande do Sul, 11 de março de 2021.
FÓRUM PERMANENTE DE MOBILIDADE HUMANA DO ESTADO DO RS
MIGRAIDH/UFSM – DIREITOS HUMANOS E MOBILIDADE HUMANA INTERNACIONAL
CAM – CENTRO DE ATENDIMENTO AO MIGRANTE
SJMR – SERVIÇO JESUÍTA A MIGRANTES E REFUGIADOS DE PORTO ALEGRE
PDMIG – PACTO PELO DIREITO DE MIGRAR REGIONAL RS
GAIRE/UFRGS – GRUPO DE ASSESSORIA A IMIGRANTES E A REFUGIADOS
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